Era
um pinheiro manso com uma copa majestosa. Sentinela avançada da
floresta dizimada pelo inexorável avanço da outra “floresta”; a
de betão. Refúgio da passarada que, entretanto, também ela
escorraçada para onde a “floresta” do progresso (?) ainda não
chegou. Dois dos últimos resistentes que a imponente árvore
acolhia, era um casal de corujas. Ao escurecer e quando mal rompia o
dia, lá estavam elas entoando o seu canto lúgubre e soturno, o que
para o imaginário popular representava agoirentas superstições,
para mim, era música celestial. Que saudades acordar ao som daquele
cântico da Natureza! Para dar lugar a mais um bloco de apartamentos,
a sentinela avançada também tombou e deixei de ter o doce despertar de então.
Raramente
já se vêm piscos e felosas nos quintais do meu bairro. Até os
outrora tão numerosos pardais, vão escasseando. Os últimos
resistentes, são os melros. Que maravilha o seu canto na Primavera!
Todos os anos, um casalinho deles, faz ninho na tangerineira do meu
vizinho. Depois, sou eu e, felizmente, outros vizinhos, que nos
revezamos de sentinela, para que os gatos não chamem um figo aos
filhotes quando saem do ninho. Por vezes, descuidamo-nos e, mais uma
vítima às garras dos felinos. São as leis da Natureza. O mesmo se
poderá dizer ao êxodo do interior para o litoral?
Valha-nos
ao menos os resistentes da “floresta” de betão para,
especialmente em tempo de clausura forçada, nos embevecer e recordar
os sons da Natureza.
Francisco
Ramalho
Corroios,
12 de Abril de 2020
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