quinta-feira, 1 de outubro de 2015

ESCUTA...

                                            ESCUTA, ZÉ NINGUÉM
Chamam-te “Zé Ninguém”, “Homem Comum” e, ao que dizem, começou a tua era, a “Era do Homem Comum”. Mas não és tu que o dizes, “Zé Ninguém”, são eles, os líderes das grandes nações, os do proletariado, os filhos da burguesia arrependidos, os homens de Estado e os filósofos.
Tu és herdeiro de um passado terrível. A tua herança queima-te as mãos. A verdade é que todo o médico, sapateiro, mecânico ou educador que queira trabalhar e ganhar o seu pão deve conhecer as suas limitações. Há algumas décadas começaste a penetrar no governo da Terra. O futuro da raça humana depende da maneira como pensas e ages.
Porém, nem os teus mestres nem os teus senhores te dizem como realmente pensas e és, ninguém ousa dirigir-te a única crítica que te podia tornar apto a ser inabalável senhor dos teus destinos. És “livre” apenas num sentido: livre da educação que te permitiria conduzires a tua vida como te aprouvesse.
Nunca te ouvi queixar: “Vocês promovem-me a futuro senhor de mim próprio e do meu mundo, mas não me dizem como fazê-lo e não me apontam erros no que penso e faço”. Deixas que os homens no Poder o assumam em teu nome. Mas tu mesmo nada dizes. Conferes aos homens que detêm o Poder, quando não o conferes a importantes mal-intencionados, mais poder ainda para te representarem. E só demasiado tarde reconheces que te enganaram uma vez mais.
Conheço-te e entendo-te. E vou dizer-te quem és, Zé Ninguém, porque acredito na grandeza do teu futuro, que sem dúvida te pertencerá. Por isso mesmo, antes de tudo o mais, olha para ti. Vê-te como realmente és. Ouve o que nenhum dos teus chefes ou representante se atreve a dizer-te: És o “homem médio”, o “homem comum”. Repara bem no significado destas palavras: “médio” e “comum”.
Não fujas. Tem ânimo e contempla-te. Tens medo de olhar para ti próprio, tens medo da crítica, tal como tens medo do poder que te prometem e que não saberias usar. Nem te atreves a pensar que poderias ser diferente: livre, em vez de deprimido; directo, em vez de cauteloso, amando às claras e não mais como um ladrão na noite.
Tu mesmo te desprezas, Zé Ninguém. Diferes dos grandes homens que verdadeiramente o são apenas num ponto: todo o grande homem foi outrora um Zé Ninguém que desenvolveu apenas uma outra qualidade: a de reconhecer as áreas em que havia limitações e estreiteza no seu modo de pensar e agir. Através de qualquer tarefa que o apaixonasse, aprendeu a sentir cada vez melhor aquilo em que a sua pequenez e mediocridade ameaçavam a sua felicidade.O gande homem é aquele que reconhece quando e em quê é pequeno; o homem pequeno é aquele que não reconhece a sua pequenez e teme reconhecê-la.

NOTA – Texto respigado do livro de Wilhelm Reich com o título em epígrafe e transcrito por Amândio G. Martins

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