Salve
8 de dezembro, o dia da justiça no Brasil, e 17 de julho, sua data comemorativa
internacional, e também os que, honesta e eficientemente, nela militam:
magistrados, membros do Ministério Público, procuradores, advogados e tantos
serventuários que lhe dedicam seu modesto e eficiente trabalho em todo o mundo,
e especialmente em nosso país e no território lusitano.
O
grande filósofo espiritualista Huberto Rohden, internacionalmente conhecido, de
quem tive a honra de ser aluno, sempre afirmava que o “direito é dos homens, e
a justiça, de Deus”; daí porque somente sob a luz da inspiração divina, a
iluminar os pretórios humanos, pode haver Tribunais de Justiça e não apenas
Tribunais de Direito, cumprindo-se,
dessarte, o recado do jurista uruguaio Eduardo Couture aos juízes: “é o
teu dever lutar pelo direito, mas se algum dia encontrares o direito em
conflito com a justiça, fica com esta”. Acrescentando ainda: “No
processo o tempo é algo mais que ouro: é Justiça".
Para
Rui Barbosa, “não há justiça sem Deus, e, quando tardia, é injustiça
qualificada”. Em sua “Oração aos Moços”, discurso como paraninfo em colação de
grau de bacharéis em Direito, proclamou: “Os processos andam nos tribunais como
o bicho preguiça no mato e penam nas mãos dos juízes como almas no purgatório”.
Segundo o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Eros Grau, “na
terra, o juiz deve cumprir a lei, justiça é só no céu”.
O
eminente Calamandrei, envolvido talvez no espírito clássico da velha Atenas,
onde era mais fácil se encontrar com um Deus do que com um homem, afirmava: “A justiça, tal como deuses, somente existe
para quem acredita nela”.
Realmente,
é preciso muita fé nela – e ponha fé nisso! Do contrário, haverá de prevalecer
o pessimismo de Geraldo Teixeira, notável jurista com grandes destaques nas
lides forenses da Bahia, segundo o qual, “a justiça é uma injustiça, e o
direito um arranjo feito para se discutir, e, na sua discussão, não se sabe o
rumo que as coisas tomam”, porque rico não perde questão”.
O
ilustre procurador de justiça Holdrado da Fonseca, um exemplar membro do
Ministério Público do Estado de Goiás, sempre dizia: “A melhor coisa da justiça
é não precisar dela”. Cumpre, porém, observar que pode ser ruim com ela, mas
pior sem ela.
Tanto
no velho como no novo testamento da Bíblia, há inúmeras referências á justiça
sempre no sentido do ajustamento da criatura humana aos princípios da mais
ampla moral que envolve o Direito que, na melhor definição, é um mínimo de
moralidade”, como sempre afirmava o saudoso professor Emmanuel Augusto Perillo, em suas filosóficas
aulas na tradicional Faculdade de Direito da rua 20.
No
livro dos provérbios (21.3) está escrito: “ o sacrifício mais aceitável ao
Senhor é exercitar a justiça” e, no Sermão da Montanha (Mateus, 5.20), proclama
Jesus: “Se a vossa justiça não for superior à dos escribas e fariseus não
entrareis no Reino dos Céus”. Para tanto, o bom senso da equidade deve
prevalecer em tudo e a justiça tem que temperar os excessos do próprio direito,
como já previa a consolidação de Justiniano, fundada em Cícero, repetindo Terêncio,
na conhecida máxima – “Summum jus, summa injuria” (muito direito, muita
injustiça).
A
justiça é a própria equidade constituindo a essência do Direito, segundo
afirmam Alexandre Correa e Gaetânio Sciascia (“Direito Romano”). Para os quais,
se o preceito jurídico a ela não corresponde, gerando conflito entre lei e
justiça, a “aequitas” deve corrigir o “jus”.
Vê-se,
pois, que a livre apreciação e convencimento do magistrado não podem
confundir-se com livre arbítrio para decidir como quiser e quando desejar, como
lamentavelmente tem acontecido, principalmente nas instâncias superiores,
sobretudo no Excelso Pretório, onde se está até legislando para julgar.
É
preciso maior celeridade no andamento dos processos, onde, ás vezes, uma
simples abertura de vista para pronunciamento do Ministério Público leva meses
para receber o despacho ordenatório, quando este muito bem poderia ser
substituído por mero ato da escrivania.
Santo
Afonso Maria de Liguori, fundador da congregação dos Padres Redentoristas
(CSSR) e prelado da Igreja Católica de Roma, era um brilhante advogado, mas, em
face de uma demorada e injusta decisão numa de suas causas, resolveu abandonar
as lides forenses e se tornou um religioso.
A
grande judicialização das questões, sobretudo as questões das fazendas
públicas, tem provocado um enorme acúmulo de processos para um número reduzido
de juízes; urge, porém, que, dentro das possibilidades, as decisões sejam mais
rápidas mediante conscienciosa apreciação do magistrado, tal como aconteceu no
ano de 1991, quando o ilustre desembargador Antônio Nery da Silva, de quem tive
a honra de ser um de seus assessores, bateu recorde com 559 decisões ( valor
muito grande na época por não se contar então
com os chamados recursos eletrônicos). Sempre ia para sessões de
julgamento plenamente consciente de todos os ângulos da questão e quando esta
era muito complexa, às vezes levava um voto alternativo para ser eventualmente
adotado, caso uma apreciação das razões da sustentação oral dos litigantes o
conduzissem a um melhor convencimento para realização da justiça.
Os juízes devem ficar muito atentos,em ordem a
evitar os apressados decretos de prescrição e decadência que muito favorecem a
injustiça e a corrupção, sobretudo nas demandas envolvendo as sociedades civis
instituidoras de recantos de lazer, em que um pequeno grupo lança títulos para
captação de recursos de milhares de pessoas e depois, concretizado o
empreendimento, com o passar do tempo, vai se tornando dono de uma coisa
coletiva, em detrimento de milhares de associados; e para isso, utilizam as decisões
de assembléias convocadas de modo mais oculto possível (letrinhas minúsculas de
diários oficiais e pequenos jornais da região) a se realizarem em dias e
horários mais impróprios.
E o
pior: uma inovação do atual Código Civil (artigo 48, § único) estabelece prazo
de apenas 3 anos para a propositura de ação anulatória de decisões irregulares
de assembléias. Assim sendo, o termo inicial desse curto prazo não poderia
ocorrer sem a mais ampla divulgação na imprensa falada e escrita, e não
simplesmente após a publicidade de registros cartorários de atas. Além de tudo
isso, é imprescindível um criterioso exame judicial de todas as circunstâncias
peculiares à decadência, para cujo reconhecimento, faz-se necessária uma
rigorosa observação de possíveis condutas delituosas.
Na
legislação civil portuguesa, a caducidade ocorre em prazo menor, mas existe um
grande rigor quanto à notificação dos sócios, que se faz através de comunicação
postal. O referido prazo não corre sem a devida comprovação do recebimento do
expediente enviado.
A
redação do atual Código Civil brasileiro, em alguns setores, não se apresenta
primorosamente como a do anterior, que foi fruto de grandes debates entre o
professor Ernesto Ribeiro Carneiro e Rui Barbosa, que levaram este a escrever a
famosa “Réplica”. Haja vista, o artigo Art. 1829-I. Acho estranho ter havido
mudança quanto ao tradicional usucapião, que passou a ser considerado como
palavra feminina, tal como está no código português.
Tal
inovação não se justifica só porque na língua latina o vocábulo é feminino
(usucapionem, na forma do caso acusativo). A fidelidade à origem, conforme a
etimologia, não se vincula ao gênero, ou seja: por ser palavra feminina na
língua materna não significa que tenha de ser também feminina na língua
derivada.
Sem
qualquer desdouro para os auditórios da justiça, onde as falhas humanas se
mesclam com as virtudes, nos acertos e desacertos, é imperioso considerar a
poderosa influência do setor econômico e político, que, infelizmente, lança
tentáculos de todos os matizes, criando, ás vezes, a estranha figura de um
direito conjuntural, em face das circunstâncias, inclusive no aliciamento das
testemunhas, cuja falsidade nem sempre é detectada. Não se pode olvidar que o
rico dispõe de recursos financeiros para o melhor patrocínio de suas causas,
levando-as ás últimas instâncias.
Seja
como for, há muitos vereditos assegurando o direito dos fracos contra a
prepotência dos fortes, principalmente quando aqueles não perderam a esperança
na busca da justiça.
Há bem
tempo, no interior do Estado (Firminópolis – anos 60/70), uma senhora pobre e
já idosa, que havia perdido a posse de algumas reses, por força de uma
temerária providência cautelar de seqüestro requerida por seu ex-amásio, sem a
posterior propositura da ação principal, lutou durante longos anos, por todos
os meios, para reaver seus semoventes – umas vaquinhas muito mansas, por que
tinha uma extremada estima.
Depois
de muito tempo perdido, peregrinando pela porta da Delegacia de Polícia e pelos
corredores do fórum, atrás de todas as autoridades, um advogado dativo, que
tentara resolver o problema extrajudicialmente, descobriu, afinal, que os
animais haviam sido abatidos em um matadouro, que os adquirira.
E um
outro causídico que o juiz lhe indicou fez tudo o que era possível para
conseguir-lhe um ressarcimento pelos prejuízos sofridos, mas, lamentavelmente,
a ação indenizatória movida contra o ex-amásio e seu advogado, que havia ficado
com a metade das reses em pagamento a honorários, não teve a procedência
decretada contra este, e o apelo dirigido ao Tribunal, buscando a condenação do
advogado, foi julgado deserto por falta de preparo de insignificante conta de
custas, pois o honesto e operoso assistente judiciário não se preocupara com o
problema das custas, julgando-se dispensado de recolhê-las, mas acontece que
ele era dativo de fato, e não de direito, uma vez que nos autos não havia ato
judicial concedendo à paupérrima autora os benefícios da justiça gratuita.
Como o condenado ao pagamento da indenização não tinha
bens para responder pela execução, a pobre coitada ficou naquela situação de
quem “ganha, mas não leva” e continuou a “via crucis” de sua peregrinação, a
ouvir sempre a mesma resposta: não há nada que se possa fazer em seu benefício.
Até que um dia, certo Promotor de Justiça (Dr. Onerlas), cansado de ouvir-lhe
as queixas, resolveu fazer algo errado, mas que, no final, acabou dando certo –
é a tal história de que “Deus escreve certo por linhas tortas”.
O representante do Ministério Público resolveu promover
uma ação penal contra o depositário do gado que o apascentava em suas terras e
que o entregara ao advogado da ação cautelar de seqüestro, em cumprimento de
ordem judicial.
Improcedente tal ação, houve recurso da Promotoria para o
Tribunal, e este manteve a absolvição do acusado, mas entendendo ter havido
crime de apropriação indébita, mandou extrair as devidas cópias para
instauração de ação penal contra o advogado, que ficara com parte do gado, para
recebimento de honorários.
E já quase no desfecho da nova ação
penal, o réu proclamava, por todos os cantos da cidade, que, após a sentença
condenatória, se suicidaria. Aconselhado, porém, por respeitáveis setores da
comunidade, inclusive a loja maçônica, resolveu depositar, em juízo, o valor
correspondente ao total das reses, e, em conseqüência, com o desaparecimento do
prejuízo, o Juiz comutou a pena privativa de liberdade para a de multa, e assim
terminou uma novela de quase dez anos de duração, com a pobre mulher
agradecendo a Deus – “a justiça tarda,
mas não falta”.
Caro doutor Vivaldo, confesso que que "me vi e desejei" para "apanhar o fio à meada" do seu texto. Já a linguagem hermética e barroca, clássica num jurista, era suficiente para deixar "à nora" um não iniciado, mas o apanhar o sentido do onde queria chegar, foi , se possível, ainda mais difícil. Necessariamente redutor, pareceu-me que entende que a Justiça é de Deus e o Direito dos homens. ""Atamancada" ( até no tempo que demora a ser exercida) o último e infalível a primeira. Será? E... se Deus não existir? Não há professor de Direito que o possa afirmar ou negar...
ResponderEliminarNum aparte, "a latere", porque não considera os " membros do Ministério Público" (sic), magistrados?! E numa curiosidade, aqui em Portugal, o 8 de Dezembro é somente... o Dia de Nª Senhora da Conceição, já que até o Dia da Mãe, passou para um qualquer primeiro domingo de Maio...
Caro Fernando - Agradeço o seu comentário.
EliminarA Justiça no meu conceito profundo é algo da consciência cósmica universal que um dia, espero eu, reinará no nosso sofrido planeta.
Os membros do Ministério Público no conceito popular representam uma verdadeira magistratura dinâmica, mas, tecnicamente cá no Brasil somente o Juiz é considerado magistrado.