quinta-feira, 19 de dezembro de 2019


Europa - o que pensava há cem anos Ortega Y Gasset...


“Não nego que os Estados Unidos da Europa sejam uma das fantasias mais módicas que existem e não me faço solidário do que outros pensaram sob estes signos verbais. Mas, por outro lado, é sumamente improvável que uma sociedade, uma colectividade tão madura como a que já formam os povos europeus, não ande perto de criar o seu artefacto estatal através do qual formalize o exercício do poder público europeu já existente.

Não é, pois, debilidade ante as solicitações da fantasia nem inclinação por um “idealismo” que detesto, e contra o qual combati toda a minha vida, o que me leva a pensar assim. Foi o realismo histórico que me ensinou a ver que a unidade da Europa como sociedade não é um “ideal”, mas um facto de quotidianidade muito antiga. Ora bem, uma vez que já se viu isto, impõe-se necessariamente a probabilidade de um Estado geral europeu. A ocasião que leve de súbito a bom termo o processo pode ser uma qualquer: por exemplo, o rabicho de um chinês que se assome nos Urales ou um safanão do grande magma islâmico.
                                                           (...)
A unidade da Europa  não é uma fantasia, mas sim a própria realidade, e a fantasia é precisamente a outra coisa: a crença em que França, Alemanha, Itália ou Espanha são realidades substantivas e independentes. Contudo, compreende-se que nem toda a gente perceba com evidência a realidade da Europa, porque a Europa não é uma “coisa”, mas um equilíbrio. Já no século XVIII o historiador Robertson chamou ao equilíbrio europeu “the great secret of modern politics””.


Transcrito do livro anexo por Amândio G. Martins



3 comentários:

  1. Eu adoro coincidências ( que às vezes não o serão assim tanto) e, por me dar esse prazer, agradeço-lhe desde já. É que vou tendo alguma "vergonha" de nunca ter lido esse livro que repousa - em edição da "Relógio D´Água - há muitos anos nas minhas estantes. Agora a coincidência: ontem manuseei-o e... cá está pela sua mão! Bom, foi o empurrão final e prometo que vai ser o meu próximo.
    Dito isto, fico com pouco saber para dar qualquer opinião que, como todas as opiniões, têm que ter algum sentido e leitura prévia para não serem simples truísmos ou desabafos mais ou menos inquinados pelo "achismo", agora muito banal e sujeito a irritações ou/e truculências prévias. Portanto fico-me somente a pensar sobre os "Estados Unidos da Europa" e sobre ser o "homem-massa" ( contra-capa do meu livro) que, por "equilíbrio", caminha para essa forma administrativa do Estado. Foi dado à estampa, em 1º edição, em 1930... Depois ainda viria Hitler...
    Voltarei quando o ler com muita atenção. Obrigado Amândio!

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  2. O que mais me fascina neste tipo de autores é que, "mutatis mutandis", parece que escrevem nos nossos dias, tal a actualidade das suas proposições.
    De facto, a primeira edição em livro é de 1930, mas ele foi feito de um conjunto de artigos que o autor começou a publicar uns anos antes no jornal madrileno El Sol...

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    1. Enquanto o senhor comentava, estava eu já recostado no travesseiro a digerir o "prefácio aos franceses" que contem as palavras que citou do autor. E a gostar...

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